A tradição de Cantar os Reis em Ovar é uma prática poético-musical multi-localizada, per formada em coletivo, localmente, em espaços públicos e privados do concelho de Ovar por ocasião da Festa dos Reis Magos (6 de janeiro), em formato apresentativo.
As Troupes de Reis (ou também escrito apenas “trupes” ou “Troupes Reiseiras”) são grupos formalmente organizados que incluem um coro, cantores solistas e um grupo instrumental de acompanhamento, totalizando entre 30 e 60 pessoas, na esmagadora maioria de naturalidade ou residência em Ovar (designados Vareiros). Muitos dos componentes das troupes mantêm-se ano após ano, mas é também comum a circulação de membros entre diferentes Troupes de Reis ao longo dos anos, O coro, que pode ser apenas masculino, misto, ou apenas feminino, é formado por um número variável de cantores (entre 15 e 45, aproximadamente). Os solistas são geralmente três, executando cada um deles as partes solísticas de cada uma das três músicas apresentadas, e o grupo de instrumentistas é variável incluindo entre 4 e 15 músicos. Os instrumentos mais comuns usados no acompanhamento são o violão (ou “guitarra clássica”, como também é designada), o violino, o bandolim, a flauta de bisel e a flauta transversal, mas também há Troupes de Reis que incluem o violoncelo, o clarinete, o acordeão, a concertina.
Ao longo do século XX as Troupes de Reis foram sendo criadas e desaparecendo em contextos de sociabilidade por vezes ligados ao associativismo local, mas também por outros critérios como, por exemplo, a vizinhança entre os membros, a existência de laços de amizade e afinidade pessoal e familiar ou outros (exemplos são a Troupe dos Velhos, Troupes dos Novos, Troupes dos Rouxinóis, Troupe da Arruela, Troupe do Comércio e Indústria, Troupe da Ponte Nova, Troupe das Noelistas, entre outras). Embora no passado não fosse uso ou tradição, no presente cada troupe exibe uma indumentária própria que permite identifica-la facilmente, consistindo num cachecol colorido e, quase sempre, uma boina, boné ou gorro da mesma cor que são usados por todos os membros durante todo o período do Cantar os Reis.
Os preparativos do Cantar Os Reis podem-se iniciar alguns meses antes da performance propriamente dita, com a composição das letras e das músicas que serão apresentadas na próxima época, tendo cada troupe os seus colaboradores próprios que elaboram as letras e as músicas, geralmente a duas ou três vozes diferentes, que depois serão ensaiadas pacientemente, ao longo de várias semanas, em grupo.
A atuação quase sempre é feita sem apresentações faladas e escutada em silêncio. As músicas “Saudação”, “Mensagem” e “Agradecimento ou despedida” podem ter introduções e interlúdios apenas instrumentais e têm sempre partes vocais solísticas, muitas vezes em diálogo musical com o coro. A “Saudação” refere-se ao momento de encontro e de interpelação aos ouvintes; a “Mensagem” centra-se no anúncio e celebração do complexo de eventos que envolvem o nascimento de JESUS CRISTO, a visita dos Reis Magos como registo simbólico da Adoração dos homens de todas as condições, fazendo também referência à Paz, ao Amor e à humanidade em plena atualidade; o “Agradecimento ou Despedida” exprime o agradecimento pela atenção prestada e os votos de bons augúrios para o futuro. O grupo instrumental acompanha permanentemente o coro e os solistas (a interrupção do acompanhamento instrumental é, por vezes, aproveitada em pequenas partes das músicas com um propósito musical de intensificação dramática, permitindo centrar a atenção dos ouvintes na voz dos cantores e no texto cantado). O andamento e o estilo rítmico-melódico das músicas são muito variados, mas o terceiro número é frequentemente num estilo festivo, com o ritmo bastante marcado (que permite muitas vezes o acompanhamento do público com palmas a acentuar a marcação do tempo).
Num esquema próximo daquele aqui descrito, entre os dias 2 e 6 de janeiro de cada ano as Troupes apresentam-se dezenas de vezes em espaços públicos e privados, na cidade de Ovar e nas freguesias do concelho. Em locais públicos, com regularidade, as troupes são recompensadas com dinheiro e geralmente com vinho do porto e Bolo Rei. Em algumas casas particulares, além da recompensa em dinheiro, as troupes são convidadas a fazer uma ceia partilhada com os donos das casas.
Bibliografia
Monografia de Ovar de Alberto Sousa Lamy;
Dicionário da História de Ovar de Alberto Sousa Lamy;
Fontes desconhecidas.